8.
Uma Notícia Boa e Ruim
Uma notícia pode ser boa ou ruim, dizia uma frase do
livro “Ditos”, por Madegal, escrito cerca de 200
anos depois desse episódio. Para Caruanã, isso
era verdade. Era bom não ter notícia, por que
o teor dela poderia ser negativo. “Será que os
sábios d´além das montanhas Andeias poderiam
mesmo obter o amuleto para mim?” Ele ainda não
sabia, mas os “sábios” levinotes já
o haviam obtido.
Caruanã também achava ruim
não ter notícia, pois ela poderia ser boa ...
e sua ansiedade, desnecessária.
Naquela tarde, porém, algo ia tirar-lhe a monotonia!
Veio a ele um servo do Grande Líder dos manvatopias
dizendo que seu senhor estava a caminho dos manvas do sul,
e desejava encontrar-se com ele.
Caruanã ficou irado. “Esse líder menor
de uma tribo decadente, sempre me importunando e desejando
uma aliança com a poderosa tribo dos dole-mundii.”
– pensou!
Antes mesmo de dizer palavras ásperas
ao servo manvatopia, seus pensamentos foram rebatidos pelas
palavras deste: “Grande Líder dole-mundii, meu
senhor tem uma informação valiosa para vossas
pretensões. Disse que se o ouvisse, não se arrependeria”
Caruanã mudou a feição,
de uma carranca fechada para uma cara de espanto. “Saberia
esse manva algo sobre o amuleto do Ancianato?” –
raciocinava ele, dizendo depois ao homem postado à
sua frente: “Ide, e dizei a teu senhor que ele será
bem vindo aqui!” O servo manvatopia despediu-se de Caruanã,
feliz por poder dar uma notícia que sabia que deixaria
seu Grande Líder feliz.
Horas depois e o Grande Líder manvatopia
aparecia no horizonte. Logo os internúncios dole-mundii
e manvatopia anunciaram a chegada do Grande Líder.
Caruanã não havia feito muitos preparativos,
primeiro porque foi uma visita de surpresa, e segundo porque
ele sentia um certo desprezo pelos manvas, tanto a tribo manva
do norte, bem como a do sul e a dos manvatopias. Feitos os
devidos cumprimentos, ambos os líderes foram para um
cômodo mais interior da moradia de Caruanã. Como
a desconfiança era abundante e recíproca, uma
pequena guarda pessoal acompanhou os dois.
“Serei breve, pois meu irmão, o líder
dos manvas do sul, me espera (não eram irmãos
de sangue, os manvas consideravam-se uma fraternidade). Tenho
uma informação para ti, Grande Líder.”
“Prossiga!”
“Mas é uma informação que acharás
valiosa, Grande Líder dos dole e dos mundii”
“Entendo ... terás minha gratidão Grande
Líder manvatopia, se tua informação puder
comprá-la!”
“Bem sabes dos meus problemas com os tassu-assus, que
eles atacam os eromês e acabam algumas vezes por nos
atacar. São guerreiros bárbaros e destemidos,
à maneira dos mundii. Sabes ainda que enfrento oposição
à minha liderança no sul manvatopia, num território
onde quase encontramos os maztenas do norte, e que as terras
ao leste do rio Silivratas estão desabitadas, mas os
ununaios (membros da tribo dos achis) não permitem
que ninguém as habite. E também ...”
“Que é isso? Acaso estás salvando os dole-mundii
de sua exterminação, para achar que podes fazer
tantos pedidos a mim? Diga o que tens a dizer, e julgarei
até que ponto a informação valerá
uma aliança.”
Os manvatopias consideravam o Grande Líder
dos dole-mundii um grande arrogante. Mal o suportavam, mas
o consideravam um excelente aliado pois, numa batalha, talvez
só os achis poderiam fazer-lhe frente em toda aquela
vasta região. Pensando nisso, o Grande Líder
manvatopia pôs-se a dizer:
“Estive visitando os eromês para selar nossa amizade
e discutir sobre um problema comum: os tassu-assus. Enquanto
uma festividade era preparada, eis que apareceu em terras
eromês um pequeno grupo de maztenas, uns dez talvez.
Maztenas fora de seu território é algo incomum,
por isso fiquei surpreso e curioso; o que faria um grupo de
maztena em solo eromê? Teriam sido expulsos e enviados
ao exílio? De repente, minha mente lembrou do amuleto
do Ancianato. Suspeitei que perderam a pedra e, para não
levantar suspeitas de tal perda, enviaram um pequeno grupo
para procurá-la. Descobri tudo da melhor forma possível,
perguntando, e um homem, aparentemente servo do principal,
confirmou minha suspeita. Caruanã ... eles estão
sem o amuleto! Essa é, portanto, uma notícia
boa e ruim. É boa, pois sabe-se que estão sem
a pedra. É ruim, pois estão no encalço
dela.”
Caruanã quase explodia de satisfação.
“Afinal, parece que os sábios de longe conseguiram-na
para mim.” A confirmação de que a tribo
maztena, que por um século jamais permitiu que a Pedra
Sácer sumisse, a perdesse agora era um indício
excitante de que seus planos iam bem.
“Ide aos manvas do sul, meu amigo. Adiantarei a investigação
anual referente ao amuleto, e se os maztenas não puderem
mostrá-lo a mim, saberei que não te enganastes
no que se refere a isso. Quando voltareis de tua visita?”
“Passarei alguns dias lá ... não planejei
o número exato”
“Vá em paz, meu amigo manva. A notícia
que me trouxeste é valiosa. Ganhaste minha amizade”
Algumas formalidades depois e o séquito
manvatopia passou a tomar seu rumo, com muitos soldados e
um assento sendo carregado por alguns homens. Caruanã
achou graça disso. Nunca levara seu assento junto com
ele. Mas seus pensamentos rapidamente se voltaram para os
maztenas.
Os dole-mundii passaram a organizar uma pequena comitiva para
investigar de maneira adiantada ao previsto se os maztenas
possuíam ainda o Amuleto ou não. Enquanto a
comitiva organizava sua partida, Caruanã já
ia reunindo-se com os chefes de sua força militar,
enviando chamados por toda a tribo, convocando todo “apto
a segurar uma lança ou um machado.”
Os dole-mundii, em especial os mundii, gostavam
do combate corpo-a-corpo e eram hábeis e vigorosos
para este tipo de luta. Havia entre alguns doles e mundii
homens de boa pontaria que causavam um dano considerável
no inimigo com suas lanças. Mas iam enfrentar um povo
que sabia manejar o arco e flecha como ninguém, usando-o
constantemente na caça e pesca.
Caruanã estava agitado e satisfeito.
Sabia que os mundii seriam subservientes aos doles por muito
tempo, se houvesse sucesso nessa empreitada. Na sua inquietação,
passou a organizar o povo que ia afluindo a ele obedecendo
a convocação militar. Mas os dole-mundii se
espalhavam por uma grande região, e reuni-los não
seria uma tarefa a ser cumprida brevemente!
|